J. J. Duran
A velha pomba branca, cansada e agitada, pousa sobre o último galho da oliveira. De cima da árvore, enegrecida pela cinza que a rodeia, ela olha para os homens fantasmagóricos que emergem da terra com suas máscaras e armas desenhadas por outros homens e encarregadas de dar fim à vida.
Caro leitor, você deve ter lido ou ouvido falar de um tempo em que outros homens, com outras máscaras e uniformes, emergiam das trincheiras da França determinados a matar ou morrer?
Era 1914, um tempo bastante longínquo, mas próximo da loucura dos homens para exterminar outros homens, também chamados de "animais racionais".
Já era 1939 quando a velha pomba visualizou as terras nevadas de Stalingrado, batizadas pela cor vermelha do sangue de filhos dessa terra e de alemães ensandecidos pelo discurso raivoso.
Mais à frente, em 1965, o Vietnã viu suas florestas desfolhadas pelo pó vermelho da nova arma produzida em laboratório com o único objetivo de eliminar eventuais adversários.
A pomba testemunhou inúmeras outras guerras, tantas que acabaram com a promessa de paz e fizeram com que seu ramo de oliveira acabasse murcho, entre os horrores desencadeados por homens irracionais.
Marejada pela dor, a velha pomba procurou totalmente em vão, entre o dantesco pueril deste universo fratricida, mirar a palavra paz, tantas vezes dita e repetida nos discursos vazios.
No tempo atual, o poder uniformizado dos guerreiros da morte arrasa a chamada Faixa de Gaza, levando à morte milhares de mulheres e crianças, como se delas fosse a culpa.
A pomba cansada, aturdida, observa suas asas tingidas pelo sangue dos inocentes, que morreram à procura da terra prometida, na qual vida e a fraternidade seriam verdade e não utopia.
A pomba então se lança rumo ao seu último voo e os jornais do dia seguinte noticiam que "sobre o céu de Gaza um míssil destruiu os ruídos das metralhadoras inimigas e matou também uma pomba". E com ela, morreu também a esperança da paz prometida. (Foto: Dreamstime)
J. J. Duran é jornalista, membro da Academia Cascavelense de Letras e Cidadão Honorário de Cascavel e do Paraná