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GETÚLIO e LULA: ESCASSEZ DE ESTADISTAS NO PODER DO BRASIL.
GETÚLIO e LULA: ESCASSEZ DE ESTADISTAS NO PODER DO BRASIL.
Por Administrador
Publicado em 22/12/2025 08:47 • Atualizado 22/12/2025 09:26
Opinião
GETÚLIO e LULA: ESCASSEZ DE ESTADISTAS NO PODER DO BRASIL.

O século XX brasileiro tem dono — e não há grande controvérsia nisso. Foi o século de Getúlio Vargas. Nenhum outro presidente, ao longo de cem anos, moldou de forma tão profunda o Estado nacional, a legislação social, a industrialização e a própria noção de soberania. Getúlio não foi apenas um governante; foi um arquiteto de estruturas. Por isso, quando se fala em comparar os maiores e melhores presidentes de todos os tempos, seu nome permanece no topo da história.

Os desdobramentos da Era Vargas impulsionaram a emergência de outros dois governos marcantes: Juscelino Kubitschek e João Goulart. JK, eleito em 1955, só conseguiu assumir e concluir seu mandato graças ao ato histórico do marechal Henrique Teixeira Lott, que liderou o movimento legalista garantindo a posse presidencial contra tentativas golpistas. Já João Goulart, eleito duas vezes vice-presidente (1955 e 1960), assumiu a Presidência após a renúncia de Jânio Quadros, respaldado pela histórica Campanha da Legalidade, organizada pelo então jovem governador gaúcho Leonel Brizola. A resposta da direita foi o pior capítulo da nossa história republicana: a imposição de uma ditadura que se estendeu por 25 anos, de 1964 a 1989.

O século XXI, por sua vez, apresenta um paradoxo curioso. Tudo indica que será difícil a qualquer liderança da direita superar Luiz Inácio Lula da Silva em centralidade histórica — não por virtudes ideológicas excepcionais ou ousadia transformadora, mas justamente pela pobreza de projeto de seus adversários. A direita brasileira iniciou o novo século como encerrou o anterior: rendida à mesmice do “deus mercado”, repetindo agendas, discursos e fórmulas, mesmo quando contesta gestões que, na essência, pouco diferem entre si. Nunca apresentou, de fato, uma visão nacional consistente.

O mais intrigante é que Lula, alçado à condição de maior referência das esquerdas no comando da República, tampouco rompeu estruturalmente com esse modelo. Ao contrário: governou conciliando-se com ele. Sua trajetória política, inclusive, nasce no interior da própria ditadura militar, que tolerou e instrumentalizou um sindicalismo controlado como válvula de escape social. Esse dado histórico, frequentemente ignorado tanto por seguidores quanto por detratores, ajuda a compreender os limites do lulismo enquanto projeto de transformação profunda.

Nesse cenário, a dificuldade da direita em produzir um estadista não decorre apenas da força eleitoral de Lula, mas sobretudo de sua incapacidade de se reinventar. Ao aceitar o ex-operário como “bom perdedor” no campo democrático-popular, bloqueou, de forma deliberada, a emergência de lideranças mais coerentes, mais ousadas e comprometidas com um projeto nacional soberano de desenvolvimento.

Leonel Brizola é o exemplo mais evidente desse bloqueio histórico. Portador de uma visão estratégica de país, defensor intransigente da soberania nacional e da educação pública, Brizola foi sistematicamente isolado. Mais tarde, Ciro Gomes — com todas as controvérsias que o cercam — enfrentou barreiras semelhantes ao apresentar um projeto desenvolvimentista fora da cartilha dominante do liberalismo econômico.

O resultado dessas tentativas malogradas é um país aprisionado entre a repetição do mesmo e o medo das alternâncias. A direita abdica de pensar o Brasil para além do mercado; parcela significativa da esquerda acomoda-se à gestão do possível; e o debate público empobrece. Não se trata de nostalgia nem de negação da democracia, mas da constatação de que, desde os anos de chumbo, o Brasil deixou de produzir lideranças capazes de ganhar consciências — e não apenas eleições.

Se Getúlio foi o estadista do século XX, com efeitos construtivos que ultrapassaram sua própria existência, o século XXI ainda carece de líderes dispostos a pensar o Brasil como projeto, e não apenas como administração da máquina pública com fins compensatórios. Enquanto isso não ocorre, seguimos reféns de nomes fortes em um cenário de ideias fracas.

Levarei este texto na convenção pedetista de julho de 2026, desejando que as próximas eleições inaugurem um embate mais promissor e salutar para o país, em consonância com o manifesto liderado por Carlos Lupi e Roberto Requião, já aprovado por unanimidade nas instâncias da sigla brizolista.

Em tempo: a saída de Ciro Gomes do PDT foi uma decepção grandiosa. Alojou-se no PSDB, convertido em um tucano de gaiola. Resta a hipótese de que a direita ou o centro o recrute numa tentativa improvável de reversão da gestão lulorentista que se projeta para um quarto mandato presidencial, enquanto outros nomes de alcance nacional permanecem aprisionados a ajustes e interésses regionais.

 

Valmor Stedile, é membro da executiva nacional do PDT.

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