Em primeira sessão após divulgação de áudios sobre propina, deputado pede renúncia de Traiano: 'Desrespeito com povo paranaense'
POLITICA
Publicado em 20/03/2024

Presidente da Alep não falou sobre os áudios nas sessões desta terça (19). Gravações integram processo em que Traiano admitiu ter pedido e recebido R$ 100 mil em propina.

O deputado estadual Fábio Oliveira (Podemos) foi à tribuna da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) nesta terça-feira (19) para pedir a renúncia do presidente da casa, deputado Ademar Traiano (PSD).

O pedido ocorre um dia após áudios gravados pelo empresário Vicente Malucelli serem revelados pela RPC e pelo g1. Nas gravações, Vicente negocia com Traiano, em 2015, o pagamento de propina.

"O deputado Ademar Traiano na presidência da Assembleia é um desrespeito com essa casa e também ao povo paranaense. E novamente eu peço que por questão de ética, que por questão moral, que a reputação e credibilidade dessa casa de leis sejam mantidas. E dessa forma eu peço mais uma vez nessa tribuna que o presidente Ademar Traiano renuncie a presidência dessa casa de leis."

Deputado estadual Fábio Oliveira (Podemos) — Foto: Leonardo Morrone/RPC

Os áudios estão em um acordo formalizado pelo Ministério Público (MP-PR) com Traiano em 2022, no qual o presidente da Alep confirmou ter pedido e recebido R$ 100 mil em propina por Vicente Malucelli

Conforme o documento, quando os pagamentos foram feitos, Vicente era diretor da TV Icaraí, que na época prestava serviços ao Poder Legislativo. O ex-deputado estadual Plauto Miró também participou do esquema, de acordo com as investigações. O contrato com a TV terminou em 2020. Relembre mais abaixo.

Antes das duas sessões plenárias desta terça, Traiano não passou pelos jornalistas para coletiva de imprensa. Ao invés disso, usou uma rota alternativa para não cruzar com os profissionais e foi direto ao plenário.

Durante a primeira sessão, o presidente da casa não fez nenhuma menção aos áudios que mostram a negociação, nem às declarações de Vicente Malucelli em delação premiada, que também foram divulgadas. Em depoimento, o empresário disse que se sentia ameaçado por Traiano.

Traiano também não ficou presente até o fim das duas sessões. Pouco após o início dos trabalhos, na primeira, ele foi substituído na presidência da Mesa Executiva pelo deputado estadual Marcel Micheleto (PL).

Traiano não participou da segunda sessão, que aconteceu logo após o término da primeira.

Repercussão

De 53 deputados, oito usaram a tribuna, mas apenas Fábio Oliveira tocou no assunto dos áudios.Ele leu a transcrição de trechos das gravações e falou que eles são "uma das evidências que a máquina pública foi usada para benefícios pessoais, a favor da corrupção".

"Eu sei que serei um dos poucos a se manifestar aqui nessa casa hoje e quem sabe eu seja o único. Isso realmente é uma pena. Todos nós aqui fomos eleitos para representar o povo paranaense. E hoje essa casa de leis sangra e o povo paranaense chora. Chora porque nós deputados estaduais estamos permitindo que esse caso se perpetue na história da Alep."

Na tribuna, o deputado Renato Freitas (PT) falou sobre ter exposto o caso de corrupção de Traiano, revelado a partir de uma briga entre os dois. Em entrevista à RPC, Renato disse que a divulgação dos áudios revela a "falência e corrupção" das instituições.

"Acredito eu que esse foi o último ato dessa trama que infelizmente revela o lado de falência e corrupção das nossas instituições, principalmente das instituições políticas."

O deputado Requião Filho (PT), líder da oposição, afirmou que a imagem da Alep está sofrendo com o caso de Traiano.

"Eu acredito que moralmente a casa vem sofrendo muito com o que está acontecendo. As questões legais impedem um pedido de cassação por algo feito no mandato passado, mas eu concordo com o deputado Fábio e com os demais deputados aqui da casa. Nós precisamos melhorar a imagem da casa com a população. Isso não é só com a saída do Traiano, isso é com a colocação de projetos sérios sobre o Paraná."

O caso 

Deputado estadual Ademar Traiano (PSD) (à esquerda) e o ex-deputado estadual Plauto Miró, na época filiado DEM e primeiro secretário da Alep — Foto: Reprodução

Segundo o acordo firmado com o MP, Ademar Traiano e Plauto Miró receberam R$ 200 mil em propina em pagamentos coordenados por Vicente Malucell

Em delação premiada feita em 2020, o empresário afirmou que fez os pagamentos por medo de sofrer represália dos dos dois no contrato da TV Icaraí, que se aproximava do fim o vencimento da prorrogação automática.

Joel Malucelli, dono do grupo J. Malucelli que é proprietário da TV, confirmou ao MP que tinha conhecimento dos pedidos de propina, mas que não participou das tratativas.

Segundo Vicente disse ao MP, cada deputado recebeu R$ 100 mil. Os pagamentos de Traiano foram feitos em duas parcelas de R$ 50 mil, pagos na sede da Assembleia Legislativa e no hall de entrada do apartamento de Traiano, em Curitiba.

Os pagamentos de Plauto, também de acordo com a delação, foram feitos a pedido de Vicente pela funcionária Georgete Soares Bender, que na época trabalhava no grupo que controla a TV Icaraí. Ela também delatou no caso e afirmou que fez os pagamento a Plauto na sede da empresa, em Curitiba, em dinheiro vivo.

Com o MP, que conduziu as investigações, Traiano e Plauto puderam formalizar Acordos de Não Persecução Penal (ANPP) e Acordos de Não Persecução Cível (ANPC) ao confessarem o pedido e recebimento de propina, além de se comprometerem a pagar multa com valores que, somados, superam R$ 740 mil.

Com os acordos, os dois não foram denunciados à Justiça e os casos foram juridicamente encerrados.

O que dizem os citados

Na segunda (18), quando os áudios de Vicente Malucelli foram divulgados pela RPC e pelo g1, a assessoria de Traiano disse que o deputado "reforça a validade legal do acordo realizado e que os documentos veiculados estão sob sigilo judicial".

Sobre a mesma situação, a defesa do ex-deputado Plauto reafirmou "que formalizou um acordo junto ao Ministério Público, o qual foi homologado pelo Poder Judiciário e plenamente cumprido por sua parte". Disse, também, que "conforme a legislação em vigor, o assunto está encerrado".

Os advogados de Vicente Malucelli disseram que, por motivo de sigilo processual, não podem fazer comentários, mas ressaltaram que, no acordo de colaboração, Vicente "já cumpriu com as suas obrigações e está comprometido apenas a ser futura testemunha de acusação, caso o Ministério Público ofereça denúncia contra os envolvidos".

A defesa de Joel Malucelli e do grupo J. Malucelli disse que não tem nada a declarar.

Georgete não respondeu, mas já afirmou que a participação dela nos fatos se limitou ao cumprimento de ordens.

A Assembleia Legislativa disse, em nota, que o contrato com a TV Icaraí foi encerrado em novembro de 2020.

O Ministério Público do Paraná disse, também em nota, que reafirma o exercício de suas atribuições e se pauta por rigorosa observância da constituição. Realçou também que o Acordo de Não Persecução Penal está em sintonia com o ordenamento jurídico.

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